terça-feira, 22 de abril de 2008

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Nação Zumbi no Jools Holland?

É, "Later with Jools Holland" trazendo "Meu Maracatu Pesa Uma Tonelada". Não sabia disso. Claro que é legal. Mas o ufanismo brasileiro sempre queima nosso filme. Veja uma seleta de cometários postados no YouTube sobre esse vídeo. Em parênteses, a "assinatura" de seus autores:

"São coisas assim que te faz ter orgulho de ser pernambucano, nordestino e brasileiro!
Impnotizante, simplesmente perfeito!" (Urameshiiii)

Vamos valorizar mais o nosso regionalismo..apoie os artistas próximos que voce conhece,comece com os da sua rua,eu vivo isso,torço por isso,faca o mesmo já ! Logo sairão de cena,os cérebros plastificados atuantes. Viva os reais desenvolvimentistas do Brasil !! (Luis Gonzaga Filho -Fortaleza)

"melhor banda do brasil ao lado de sepultura e diesel !!!" (rogerfreemind)

"nação é nação. "carrego pron'di for o peso do meu som". essa frase é foda!" (Oriam00)

"som do caralho...os cara eh foda...mesmo sem o chico os cara manteve o som de alto nivel...MANGUEBEAT PORRA!!!!!"(Vinicius Bolha)

"NAÇÃO BRÓCA MO PAAAAAI \o/" (billaliu8)

E depois reclamam que eu souy anti-social e "desinternetizado".

Adiós, Toto!

Aos 38 anos de idade, Gerardo "Toto" Rotblat morreu de edema pulmonar anteontem. Toto foi percussionista das bandas argentinas Todos Tus Muertos, Mimi Maura e Dancing Mood, com quem encerrou a carreira e tocou em um palco pela última vez, em 28 de março. Mas ele ficou famoso mesmo (por esses lados) por ter feito parte de Los Fabulosos Cadillacs durante seus "anos de ouro" (1991 a 2000). O cara parecia o Gordinho (do desenho "Bicudo, o Lobisomem"), era discreto e, não bastasse esmerilhar nas congas e atabaques, fazia compelxos e suingadíssimos "arranjos percussivos" para as bandas pelas quais passou.

Toto não aguentou a guerra de egos entre Vicentico e Flavio e deixou o LFC para se juntar aos também demissionários Sergio Rotman e Mario Siperman na banda que acompanhava Mimi Maura, esposa de Sergio.

Aqui, Toto faz seu melhor numa rendição de "El Satanico Dr. Cadillac", uma das poucas faixas tocadas com emoção e entrega no desanimado show de quinze anos da banda (2000), pouco antes de seu fim. Para quem nunca o viu, é o percussionista de camisa vermelha e cara de cervejeiro boa-praça.

Vai batucar na cabeça dos anjos, Toto. Você merece toda a paz!

terça-feira, 8 de abril de 2008

A verdadeira literatura dos bares

Bukowski que nada! A verdadeira literatura dos bares é feita por quem a freqüenta e discorre a sabedoria em colocações poéitcas e contundentes. Como Chico Beiçola, a lenda do Bar do Treze, em Taubaté (SP).

Próximo ao fim de uma partida de sinuca na qual derrotava com grande folga um amigo, Chico soltou essa:

"Gostaria que você estivesse no meu lugar, nem que por um segundo apenas, para poder saber a vergonha que sinto em ser seu amigo".

***

Em outra ocaisão, Chico foi abordado por freqüentadores do mesmo bar, que leh perguntaram porque sempre passavam por sua loja de materiais esportivos e nunca o encontraram por lá.

- Vem cá, quantas vezes você já foi ao [supermercado] Pão de Açúcar? - perguntou agressivamente Chico.
- Várias - respondeu cheio de incompreensão um dos jovens.
- E por acaso em algumas dessas vezes cê viu o Abílio Diniz por lá?

***

Isso lembrando que Chico já foi apresentado às profissionais do meretrício como um francês de nome "François Beiçolê".

Poético.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

P18

O P18 é uma senhora macumba para turista, mas feita com muita classe e excelentes músicos. fundada por Thomas Darnal e vários amigos (inclusive Sylvane Matadin, do Urban Dance Squad) após o fim do Mano Negra, era uma espécie de arquestra afro-latina com ritmos eletrônicos, dançarinas negras e um clima meio chiquê. Não é para todas as horas, mas tem momentos em que ninguém é mais apropriado que eles.

Vai aí "Eletropica", a mais "pista" de todas, só para variar um pouco.

sábado, 29 de março de 2008

Escola de Marketing Tríplice Fronteira

Inovadoras e ousadas técnicas de vendas empregadas aqui na região. Fui alvo de todas elas. Por partes:

No Paraguai (Ciudad del Este):

- "Ô, rapaz! Aqui, moço, meia barata! Muita coisa boa, ó! Vem ver! Vem cá... Vem, FILHO DA PUTA"!
(empregado por um vendedor de rua).

***

- "E aí, quer máquina digital roubada? É baratinho. Celular também, roubado, tudo barato."
Diante do meu silêncio, o insistente vendedor solta essa:
- "Qual é teu problema, amigo, você não fala? Não tem boca?! (ameaçador) Fala alguma coisa!!"

***

Outro vendedor de rua. Para todos que passam, ele oferece mecanicamente "eletroeletrônico, celular", repetidas vezes. Eu passo ao lado e, possivelmente motivado pelo meu cavanhaque e minha cabeleira encaracolada, recebo essa:

- "E aí, loucão, bala, doce, heroína?"

***

Outro vendedor, usando abordagem idêntica em uma outra esquina, só muda a oferta dirigida a mim - já de cabelo curto, mas com uma nada discreta barba.

- "E aí, pó, tá a fim? Tem arma também, coisa fina, não é treta não!"

***

Decido me barbear antes de qualquer ida à Ciudad del Este.

Em Foz do Iguaçu:

Depois do já clássico "1 pastel = R$ 0,25; 4 pastel = R$ 1,00", não conseguiram mais inovar. Tudo aqui é "um novo conceito em...". Mas esses dias os empresários locais se superaram. Abriram uma clínica de tratamento dentário cujo slogan é "um novo conceito em odontologia". O nome da clínica? Conceito.

("Conceito... um novo conceito em odontologia"... soa bem, não?)

Temos a única "Panificadora & Locadora" da região, mas os donos também andam marcando touca. Ainda não fizeram nenhuma promoção tipo "compre dez pãezinhos e ganhe uma locação catálogo". Desperdiçando oportunidades.

Os nomes dos empreendimentos também andam falhando. Aqui, o que não é "mania" - "Pura Mania", "Kilo Mania", "Baby Mania" e o precioso "Beto Mania" (??) - é "Cia." Detalhe que na maioria das vezes, os próprios donos não sabem que "Cia." significa "companhia", e anunciam suas lojas como "Cia do Saber", "Cia do Lar", "Queijo e Cia"... Seria o feminino de "cio"? Então tá na hora de uma casa de produtos agropecuários ser batizada de "Cia da Terra", não é mesmo?

Ah, e aqui usam a expressão "vuco-vuco" em anúncios de liquidação. Triste.

Mas quando a coisa aberta, Deus vem dar uma ajuda aos marqueteiros. Uma loja de artigos evangelicos ("d'Deus", belo nome, hein?) aqui tem um "transadíssimo" adesivo em sua vitrine anunciando assim:

"Wear Your Faith: Worship Style Design".

U-hú!



quinta-feira, 27 de março de 2008

Mano Negra no Rio

Eco 92. Jello biafra imprecando contra Bush pai e mudando a letra de "I Fought The Law" para sacanear o então presidente. A maior banda francesa (ou do mundo?) da história no palco. No fundo, os Arcos da Lapa. Abaixo, milhares de brasileiros que nem sabiam o que era aquilo se soltando ao "deixa rolar" provocado pelo "Patchanka Sound" da Mão Negra. Fechando a festa, a sua anfetamínica versão da canção tradicional "Sidi H' Bibi", com os vocais cheios de energia do percussionista argenlino Phillipe Teboul, Manu Chao assumindo o baixo, a dança epilética do trombonista Kropöl e o baixista habitual Jo Dahan mal se aguentando em pé.

Clássico!

Abração...


Porque a Páscoa já passou, e a vida nova parece que tá batendo aqui, na minha porta, insistentemente.

E às vezes fica bem claro que você não precisa ser religioso para ter fé, nem ser maluco para falar com Deus. Tem hora que ele tá a fim de conversa.

Porque às vezes ninguém precisa explicar nada. As coisas apenas vêm, e nós podemos fazer bom uso delas. Amém.

Depois de "Deus é o Número 1"...


Eu sei, eu sei... cada um faz o que quiser da vida e não tem nada de particularmente ofensivo nesse adesivo aí. Mas que eu não contive o riso quando eu o vi, ah, pode ter certeza!

quarta-feira, 19 de março de 2008

Mimi Maura no Scream&Yell



Essa simpática moça da foto acima foi uma descoberta advinda da Rolling Stone latina. Grata foi a surpresa de descobrir, a posteriori, que ela é secundada pelos ex-Fabulosos Cadillacs Sergio Rotman e Toto Rotblat. Motivo a mais para apreciar o som da guria.


Mirando Caer La Lluvia me parece ser o mais interessante de seus quatro discos e a resenha dele aporta aqui numa cortesia de Leonardo Vinhas e Marcelo Costa.

Microconto nº 06 - Insistência

Cansei de dizer a ela para não me dar ouvidos, mas ela não me escuta.

A díficil arte de saber quando parar

Sou, entre outras coisas, professor. Neste trabalho, costumo alternar aulas mais introspectivas com outras mais “enérgicas”. Em ambos os casos, é difícil identificar o momento em que o estímulo à reflexão vira egotrip vazia ou mera pieguice; ou saber quando a farra deixa de ser divertida e passa a ser repetitiva ou forçada. Os anos aprimoram o instinto, mas ainda assim, é difícil saber quando parar.

O mesmo parece acontecer em todos os demais aspectos da vida. Grandes bandas sujaram os últimos anos de uma biografia que começara boa por insistir em levar adiante um projeto que não se sustentava mais. Casais ou até amigos que não têm mais a compartilhar ou acrescentar raramente se dão conta disso sem que haja muita briga e choradeira, que tendem a anular quaisquer chances de boas recordações. Trabalhos produtivos se transformam em fonte perpétua de aborrecimento e enfado porque não quisemos largar o osso que já tinha sido inteiramente roído.

Tenho a impressão que isso tem a ver com o fato de nos apegarmos a coisas e pessoas, querendo que de alguma maneira eles pertençam a nós e permaneçam imutáveis, congelados na condição que exibiam quando passaram a nos agradar. Claro que esse é um comportamento fadado a levar à frustração e até ao desespero. As coisas não ficaram como eram. Acho engraçado quando encontro alguém que diz, orgulhosamente, ser o mesmo que sempre foi. É óbvio que conservamos uma âncora dentro de nós, que preserva certos traços que nos compõem de maneira indissolúvel, mas o passar dos anos e dos acontecimentos certamente provocam mudanças em nós. Criamos nossos pequenos portos seguros em nossos rituais – eu tenho que tomar café-da-manhã lendo gibi da Disney todos os dias – mas isso é apenas um gesto (muito humano) de segurança, de manter a “ordem” em pequenas coisas que podemos controlar.
Porém esses rituais não desviam (ou não deveriam desviar) a atenção do fato de que as coisas terminarão. Tudo chegará ao seu fim, e muitas vezes insistimos em segurar o cadáver de algo ou alguém que já se foi, confiante que a força das lembranças trarão de volta aquilo que tanto prezávamos. Não trará.

Faz pouco, estava me envolvendo em uma montagem teatral: um papel de destacado, uma produção aparentemente grande. Nada pelo qual eu tivesse interesse especial: era uma montagem de Gota D’Água, do Chico Buarque. A primeira debruçada sobre a peça me trouxe as muitas falhas do texto, que só eram evidenciadas e somadas a outras a cada leitura ou análise feita por mim ou pelos meus companheiros de elenco. A coisa simplesmente não virava. Em tese, pagaria um bom dinheiro (“em tese” porque ninguém viu a cor do cachê após uns meses de trabalho*, mas há promessas e datas ainda vigentes), e melhor, estava na companhia de pessoas que respeito e de outras que posso chamar, com alegria, de “amigos”. Mas por inúmeras razões, a coisa não estava indo adiante para mim, e decidi parar antes que pudesse me comprometer ou comprometer ao trabalho que está sendo desenvolvido.

Não foi uma decisão das mais fáceis – largar um osso que ainda aparenta ter muita carne. Mas tem horas que o cachorro precisa entender que há outros ossos por aí, e que ele não pode empatar a dos outros cães da matilha, ou assumir que aquele osso não é pra ele. Ou simplesmente ver que aquele osso, mesmo disponível, não lhe interessa.

É difícil sair no meio de algo que ainda não está completamente degringolado (e talvez nunca esteja), porém preferi correr o risco. Alguns chamariam de fuga. Eu chamo de aprendizado. Aprendizado limitado, pois a partir de hoje jamais saberei como será participar daquela peça, como seriam as coisas se eu estivesse por lá bancando o Creonte – só poderei aprender o que acontece tendo deixado a peça. Mas precisamos exercitar o timing da hora de parar, porque vai chegar a hora em que pararemos sem aviso, e então deve ser bem ruim deixar coisas incompletas ou feitas porcamente.

* escrevi isso faz uns dias. Anteontem fiquei sabendo que os trabalhos estão “em recesso” por falta de verba. Pelo visto, exerci bem o timing dessa vez. Com uma bela ajuda da Senhora Intuição. Provável que haja mais uns escritos sobre isso em breve.

terça-feira, 18 de março de 2008

Os Dez Melhores Shows... que eu não vi!

Bob Dylan esteve no Brasil. Festivais pipocam por toda a Europa no meio desse ano. A Argentina oferece todo tipo de show a quase toda hora, e organiza seus festivais.

Como não pude ir ao Dylan e não acho que vou para a Europa tão cedo, esses ficam de fora. Fui ao Cosquín Rock 2008 porque quis viver a “era festivalera” na Argentina enquanto ela acontece. Não quis vivê-la através da nostalgia em DVD nem através de textos cheios de paixão vazia ou tecnicismo estéril, quis vivê-la in loco, enquanto ela ainda não é uma instituição consagrada tampouco escorrega para a decadência.

São momentos raros, saber que algo é importante para você (mesmo que seja algo tolo) e correr atrás disso sabendo de sua fugacidade. Quando eu era um molecáo descobrindo as demos (ainda em fitas cassetes) de Little Quail, Chico Science e Raimundos, não imaginava que aquilo seria o último sopro de vida airada e inteligente dentro do pop nacional, apesar dos filhotes dos Raimundos terem crescido para virar o Charlie Brown Jr. (isso já é outra história). Da mesma maneira, o tal do grunge não mereceu muita atenção minha – eu só gostava do Ten, do Pearl Jam, e de umas musiquinhas do Nirvana – não dava muita bola pro resto, mesmo assim tava lá no Hollywood Rock e quem ia dizer que uma pá de garotos iria olhar para mim hoje em dia com admiração e inveja por causa disso?

Esses garotos invejam o que não viveram, e que talvez vão idealizar pelo resto de suas vidas. Eu também gostaria de ter estado em muitos lugares e eventos onde não estive e jamais estarei - porque eles pertencem ao passado. Porém, pistas quase concretas (registros de áudio e vídeo), somados à mitologia e o envolvimento emocional, organizariam a seguinte lista de prioridades de shows (para ficar só na música...) na eventualidade de inventarem uma máquina do tempo:

  1. The Who em Leeds;
  2. Mano Negra no festival Pink Pop, Holanda;
  3. Neil Young no Rock in Rio 3;
  4. Faith No More no Rock In Rio 2;
  5. Qualquer show dos Afghan Whigs da época em que pessoas do público subiam ao palco para agredir o Greg Dulli, devido ao tom provocadoramente perturbante das letras;
  6. Qualquer show dos Afghan Whigs fase 1965;
  7. Jorge Ben na turnê do África Brasil;
  8. Nick Cave And The Bad Seeds no Projeto SP;
  9. The Smiths naquele pavilhão onde eles gravarão Rank;
  10. Catupecu Machu no Pepsi Music 2006 logo após o acidente que destruiu parte da massa encefálica do baixista Gabriel Ruiz Díaz, só para ver a massa gritar "Gaby!" em lugar de "Dale!", na canção em questão.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Quando chega OAEOZ

Foz do Iguaçu, 10 de março de 2008, 21h38min.

- Vi que o Ivan mandou o pacote pra você.
- Pois é, chegou hoje.
- E aí?
- Tá bonito pra caralho!
- Você ouviu o disco inteiro??!!
- Pô, claro que não! Cê sabe como é, cada música d’ OAEOZ tem cinco, seis minutos (mal levo 10 para chegar ao meu trabalho).
- É, eu sei, e depois de cada uma você pára e fica 10, 15 minutos pensando, pensando...

Esse diálogo – travado entre eu e minha namorada – ilustra o que OAEOZ pode fazer por você, é algo que eles nem tem como idea mater ou mesmo como intenção discreta, mas acaba virando uma prerrogativa da maioria de suas composições (às vezes, eles dão bola fora). O Ivan em questão é o Ivan Santos, sujeito que compõe a maior parte das composições dessa banda curitibana que vive fazendo concessões.
Concessões? OAEOZ, perguntarão, indignados, alguns que já conhecem a banda. Sim, concessões, não no sentido mercadológico da coisa (isso equivaleria a gravar axé, “Créu” ou algo do tipo), porque o “rock” deixou de ser mercado no Brasil e, mesmo, OAEOZ não é uma banda de rock’n’roll. As concessões que esses quatro cavalheiros fazem são a si mesmos, à sua vontade de seguir como banda, de encontrar caminhos musicais que fujam da própria obviedade de seus gostos, que já não são em nada óbvios. Concedem a cada integrante a chance de dizer o que precisam, nem que seja na base da porrada, que atropela a eles próprios. Não se trata de uma banda pacífica, e nem me arrisco a dizer que seja um grupo de amigos ou de pessoas louváveis (“não gaste muita piedade que a maioria aqui é chave de cadeia”, me disse o Ivan a respeito de quase todas as pessoas que conheci em torno da banda, inclusive a própria). Isso não quer dizer que não sejam quatro homens sinceros, quatro músicos peculiares e únicos, quatro pessoas com um senso de urgência que transparece em sua música graças à sensibilidade ímpar de cada um. E se isso não é louvável, não sei mais o que é.

Mas enfim, quem precisa de louvores é Deus. Nós, aqui na Terra, precisamos de sentimentos mais palpáveis que a mera adulação, sentimentos que você encontra nas linhas e espaços em branco de cada um desses discos e dos dois anteriores. Os “anteriores” são Dias e Às Vezes, Céu; e “esses dois” fazem parte do pacote que estão lançando agora, Falsas Baladas e Outras Canções para a Estrada e Ao Vivo na GGG, já que os trabalhos se acumularam desde 2005 e agora ambos saem ao mesmo tempo da jaula onde foram gestados.

Não me surpreende que Ao Vivo... seja o melhor dentre os quatro discos d’OAEOZ. A banda sempre fez mais sentido ao vivo que em disco, sempre impressionou mais no palco que em estúdio. Isso é curioso vindo de uma banda que não tem um peso rítmico bruto, cujo som se alicerça mais em detalhes que em explosões, visões que focam mais algumas árvores que a floresta toda, mas procede. O registro da GGG (ao cargo do Carlão Zubek e dos ex-BAAF Rodrigo Barros e Luiz Ferreira) foi o que melhor preservou a beleza das passagens instrumentais do OAEOZ, o único a conseguir registrar adequadamente o peculiar equilíbrio vocal que se estabelece na alternância ou na soma de vozes de seus integrantes – nenhum cantor per se, mas todos vocalistas, capazes de deslocar suas entranhas através de seus sistemas fonadores e ressoarem através das caixas torácicas alheias. Tem “Meg e John”, uma bela canção de fuga de Rubens K que há tempos pedia um registro decente, e aqui encontrou, e que quase empalideceu diante da entrega de “Conversa na Laje”, da força de “Desculpas (Não Quero Saber)” e da beleza etérea de “Deserto” (e eu, que apertei sonolento o play sem saber o que estava no aparelho, pensei: “de onde que veio essa coisa quase new age?”).

O show da GGG também traz o que sempre me soou como o maior destaque individual no som da banda: o baixo errático mas não impreciso levado nos dedos de Rodrigo “Zóio”, um caminho acidentado de notas que formam uma paisagem à parte na qual o resto se deposita. Claro, é algo totalmente aberrante para quem tem Renato Rocha como referência nas baixas freqüências, mas deixa esse povo com seus uns e outros.

Os elogios a uma parte do pacote não desmerecem a outra. Imagina, “Mariane” tá indo e vindo no player enquanto escrevo esse texto; “Pra Longe” é a concisão (que engrandece conforme a execução vai acontecendo) de tudo o que a banda já se propôs a fazer; “Negativa” vem para lembrar que o trompete de Igor Ribeiro sempre pode fazer seu coração tremer e suas pernas baterem mais forte (ou será o contrário?). É que ele marca menos, por ter sido gestado em tanto tempo e por trazer tentativas não tão logradas de soar alto (“Ninguém Vai Dormir” e “Impossibilidades”). Mas quem disse que OAEOZ é uma banda perfeita?

Já escrevi mais de uma vez que é nas próprias brechas que OAEOZ se sustenta, não em suas virtudes, mas sim em sua própria falibilidade. É como o material que nos faz humanos: a beleza vem do erro, a verdade vai embora aos tropeços e a esperança vem de onde menos se espera: de dentro.

Microconto nº 05

O pai, agonizante, seguia fiel aos seus princípios. Não colaborava nem para morrer.

Microconto nº 04

Nunca esteve sozinho. Sempre teve que suportar sua própria péssima companhia.

terça-feira, 11 de março de 2008

Sempre se ceifam vidas... e se colhe o que?

No blogue anterior, cheguei a escrever sobre uma certa denominação evangélica internacional bastante obscura e maquiavélica que é bastante forte aqui em Foz. Uma vez livre do meu trabalho de então, que era ligado à essa “igreja”, acreditei que me manteria distante de suas falcatruas, idiossincrasias, incoerências e contos de crueldade operada através da manipulação da fé. As últimas semanas vêm me dando provas de que eu estava muito enganado a respeito disso.

Comecemos pelo pastor da dita igreja: não obstante seu salário de R$ 15.000,00 (quinze mil reais, para quem ficou em dúvida quanto aos algarismos), ele teve suas viagens de “evangelização” ao Canadá e à Terra Santa paga pelas coletas feitas entre os fiéis. Até aí, nada que uma grande empresa não pague a um executivo. Mas assim como o capitalismo nos faz crer que o executivo viaja para trabalhar, a religião nos leva a pensar que o missionário viaja para cumprir sua sempre questionável missão de “evangelizar” ou mesmo “estudar para a evangelização”. Se uma empresa constata que o tal diretor usou da viagem para obter ganho pessoal e negligenciou o trabalho, isso rende uma justa causa e um processo. Como a denominação em questão se pretende extorsiva e desejosa de lucros abusivos, não foi surpresa nenhuma saber que o pastor passou mais tempo em cassinos e bunkers suspeitos que em casas de oração ou seminários. Fontes próximas garantem até uma escala em Orlando para conhecer a Disney – quem sabe eles queriam converter o Mickey e a Minnie, que dão mau exemplo dos valores cristãos através de sua relação domiciliar e não-conjugal? Embora eu ache mais fácil crer que eles queriam mesmo era “ceifar” o Tio Patinhas e seus bilhões. Ia dar algum trabalho converter as patacas em reais, mas confio que eles achariam um meio.

Ora, mas qual igreja não vive dessas coisas? – perguntará o cético de senso comum. Então deixe-me dar um pouco mais. Que tal o pastor entrando completamente embriagado com uma menor de idade em um dos hotéis mais luxuosos da cidade, exigindo uma suíte para passar a noite? Diante das negativas do recepcionista, que argumentava dizendo que menores não podem hospedar-se sem autorização dos pais, ele recorreu às suas credenciais: “eu sou o Pastor Fulano e exijo esse quarto” (transcrição não-exata, seu discurso teria sido um pouco mais extenso, eloqüente e intimidatório). Detalhe: o recepcionista era um fiel de sua igreja até então. Era.

Estou contando essas histórias todas por mero achincalhe ou por moralismo? Nenhum dos dois. É que continua me incomodando o uso do discurso religioso para arrogar a alguém o direito de manipular, menosprezar e até desfazer-se da vida das pessoas, aproveitando brechas na fragilidade de cada um para cravar ali dentro a imagem de um Deus monstruoso que salva ao mesmo tempo que castra e ameaça, justamente para que uns poucos “homens desse Deus” possam aproveitar-se de tudo aquilo que condenam em sua retórica: conforto material, prazeres mundanos, soberba, fartura, vaidade.

Estava em um aniversário ontem, na presença de pessoas queridas – várias dessas, ex-fiéis dessa igreja. Uma delas, uma jovem muito bonita e geralmente de trato agradável, foi lançada numa espiral de paranóia e anti-depressivos que, embora bastante amenizada, não se desfez por completo até hoje. Ela era uma das “lideranças jovens” na tal igreja, posto até onde chegou tendo que dar um “testemunho de cura e libertação” da vida sexualmente promíscua (para os padrões deles) que ela levava. Não muito tempo depois disso, o pastor – aquele do hotel – disse a ela que “gostaria de invadir seu apartamento e estuprá-la para que você fosse minha e de mais ninguém”. Isso foi o ponto culminante de outros eventos quase tão temerosos quanto, que não transcrevo nem insinuo aqui para preservar a identidade da moça. Detalhe: o pastor é casado e pai de duas crianças.

Enfim, eu planejava escrever esse texto listando esses e outros fatos, sem entrar muito em qualquer análise. Não consigo. Isso já me dói o suficiente e é melhor eu parar por aqui.

Cristo te odía

Para ilustrar o post acima, as palavras de Roberto Musso nessa grande canção do Cuarteto de Nos. Acredito que mesmo os amigos que não sabem espanhol não precisarão de um tradutor para entender do que se trata...

CRISTO TE ODÍA

No tenés plata para nada
debés un mes del alquiler
te echaron ayer del trabajo
y te abandonó tu mujer.

Y vos vas corriendo a la iglesia
y ya te ponés a rezar
a pedirle a la virgencita
un milagro te pueda salvar

Y la gripe te está por vencer
esperando el 506
y el pastor de TV te saluda sin ver
desde el Mercedes Benz.

Cristo te odia.

Vos comés ratas y gusanos
en un rancho roñoso vivís
pero que lindo el Vaticano
que no hay ningún cantegril.

Y nació tu décimo hijo
que no vas a poder criar
porque no era de buen cristiano
anticonceptivos usar.

Y no quisiste ir al doctor
y tu hernia el milagro no curó
y lo ves al doctor abrazado al pastor
que con tu plata su hernia operó.

Cristo te odia.

No creo en Díos todopoderoso
creador del cielo y de la tierra
hacedor de males y tempestades
castrador de voluntades.

Creo en mi, nada poderoso
creador de iglesias
y en milagros.

Pare de sufrir
Colabore
Cualquier moneda sirve
Amen

segunda-feira, 10 de março de 2008

Manu Chao - La Radiolina

Uns meses atrás, o Diego Gerlach me convidou para integrar o redivivo Gordurama. Mas por razões que apenas o Gianecchini pós-disenteria dos pampas conhece, já se passaram bem mais de três dias e o site não ressucitou. Enquanto a Segunda Vinda não acontece, decidi postar aqui um (talvez mais, mais para frente) texto que fiz para esse retorno. então vamos lá:


A velocidade não muda a estrada OU Porque você não precisa ativar a função “Repeat”

Foi em 1999 que Manu Chao se livrou da sombra do Mano Negra e lançou seu primeiro disco solo, Clandestino, uma mistura de inquietação viajante com preguiça cachaça-maconheira traduzida em climas musicais (“uma coisa meio etérea, quase new age”, nas palavras equivocadas do próprio). Clandestino captava o espírito utópico e delirante que antecedia a concretização da União Européia, quando quem tinha grana e alguma fumaça na cabeça chegou a realmente acreditar que as fronteiras deixariam de existir, ou ao menos, de funcionar. E talvez por isso, tenha se tornado o álbum preferido de modernetes, estudantes de História e Ciências Sociais, e, acima de todos, de mochileiros europeus, vagabundos ou filhinhos-de-papai que pagavam de radicais comprando pacotes de viagem para o salar de Uyuni na Bolívia e outros lugares "exóticos". O disco certo nos ouvidos errados.

O problema é que Chao começou a levar esse papo a sério demais, a militar em tudo quanto é lugar onde o povinho “pensante” adore barulho, dos panelaços argentinos aos acampamentos brasileiros do MST. Isso lembrando Manu é franco-espanhol, com residência em Barcelona – protestar contra o ETA é mais arriscado, né gurizão? Manu Chao se tornou um ícone pop tão forte quanto um Che Guevara sem a revolução. E daí para a auto-repetição foi um pulo, ou melhor, um disco: Próxima Estación: ¡Esperanza!, no qual repetia bases e frases (textuais e musicais) do álbum anterior, reduzindo o “discurso” outrora simpático e um pouquinho mais articulado a uma meia-dúzia de frases dignas de servir de legenda de foto de orkut de guriazinha "antenada" de Floripa. E se você achava que depois de uma música como “Homens” (“homem tem que ter celular / carro importado / tem / tem muito homem”, cantada por uma negrona que ele traçou no Rio de Janeiro) e depois de ter gravado com o Skank ele teria um mínimo de dignidade e se retiraria de cena, se enganou feio.

A conseqüência desse “processo” foi um disco ao vivo no qual, não contente em repetir bases e frases, reprisava músicas, gritando “bombála, bombábla, bombála” a cada cinco versos. Como ele declarou que já tinha cumprido seu contrato de três discos com a gravadora e que por isso não lançaria mais discos, você se contentou em ficar com o que ele já tinha lançado de bom (sua estréia mais toda a discografia do Mano Negra) e desencanar de vez do cara e da sua turminha de fãs. Mas aí o ego (já que grana ele garante que tem de sobra) falou mais alto e ele teve que fundar um selo e lançar um disco novo, e veio esse La Radiolina. Letras em portunhol, francês, espanhol e inglês de índio de faroeste, imprecações contra Bush e transmissões de rádio. Peraí, esse não era o Proxima Estación: ¡Esperanza!? Hmm... não.

Diferenças, diferenças: “está cheio de guitarras e furioso”, diz a imprensa latina, tentando alardear a novidade de seu companheiro de putarias. Há mais guitarras, sim. Mas daí a chamar isso de fúria é a mesma coisa que dizer que a Wanessa Camargo tá granvado hardcore só porque uma de suas tentativas de power ballads tem uma semi-distorção no refrão. As guitarras estão marcando mais presença, mas falham em todas as suas tentativas de falar alto. Quando sussurram ou marcam uma linha étnica-clichê, funcionam muito melhor, como em “Politik Kills”, “Piccola Radiolina” e “Soñé Outro Mundo”.

Os tons caribenhos algo forçados do tal Próxima Estación... ficaram de fora. Quando é para “latinizar”, ele consegue escapar do estereótipo de mariachi moderno (ou melhor, mantém o estereótipo, mas de forma convincente), aprimorando “Me Llaman Calle” ao ponto de ela virar uma das melhores faixas do disco (a música tinha sido gravado de forma incidental na companhia dos Paralamas do Sucesso no disco Hoje, dentro da ótima “Soledad Cidadão”). Os reggaezinhos frouxos também foram abandonados, substituídos por punkzinhos frouxos, que parecem um pacote de 150mg de Tang Mano Negra diluído no Oceano Índico. Esquece essa parte. Se você ouviu o primeiro single, “Rainin’ in Paradize”, sabe o porquê. Esquece mesmo.

Onde ele revisita a idéia básica de Clandestino é a parte na qual o disco funciona. “La Vida Tômbola”, “Mala Fama”, “Tristeza Maleza”, “Amalucada Vida” (ou: “Minha Galera - versão 2007”) estão aí para provar o que digo. E nem vamos mencionar que elas têm, pela 209ª vez, os versos “yo soy un hombre sincero”, “calavera no llora” e “bombála, bombála, bombála”, que o assunto ainda é só a música. Porque o todos os textos repetem a mesma ideologia da revolução botequeira dos universitários de Sociologia e Jornalismo: o mundo é cruel, o sistema é mau, as festas nunca duram o suficiente, etc. Numa espécie de reassimilação do comedor pelo alimento, Chao assumiu a “ideologia” dos seus fãs, fazendo críticas fáceis e sem embasamento algum contra qualquer coisa. Quer exemplos tirados de entrevistas e letras? Então vamos lá:
  • “as gravadoras ganham com a pirataria porque elas produzem os aparelhos para copiar discos” (Rolling Stone latina de setembro). Só a Sony produz CDs virgens e gravadores de CD.
  • “Señor Presidente George Bush: cuidado. Lo estoy observando”, diz uma voz “ameaçadora” em “Tristeza Maleza”. Tá. E vai fazer o que? Tacar uma bomba no Pentágono? Se candidatar às próximas eleições presidenciais? Ou comandar um boicote contra as calças jeans e o modo de vida americano em geral?
  • “Politik Kills”. O título já explica a indigência mental. E a gente achando que depois da Plebe Rude ninguém mais teria coragem de escrever e gravar coisas assim...


Poderia continuar mas já deu para você entender. Queremos crer que, no fim, nada disso importa. E queremos crer que o disco é bom, porque Manu parece ser um cara gente fina. Mas e se eu disser que mesmo essas bases legais que foram comentadas nesse texto aparecem repetidas em quatro ou cinco canções desse disco? Se eu trocasse “Soñé Outro Mundo” por “Outro Mundo”, “13 Días” por “Besoin de la Luna”, “Y Ahora Qué?” por “The Bleedin’ Crown”, nada mudaria, só as letras. Tudo igualzinho...


No fim, Manu não deve ser um cara tão legal assim. Deve ser aquele bebum divertido que chega uma noite e surpreende a todos, mas depois se revela um chato, contando sempre as mesmas histórias e as mesmas piadas como se fossem novidade. Mas pela camaradagem e pelo passado digno, você ainda o agüenta.

Poderia ter sido um disco quase bom, mas é repetitivo. Já não escrevi isso antes?

Microconto nº 03 - Despedida

- Que horas cê vai?
- Na hora em que você não estiver mais aqui.

sexta-feira, 7 de março de 2008

quarta-feira, 5 de março de 2008

Microconto nº01

- Vam'bora. Não tá esquecendo de nada?
- De nada que eu queira me lembrar. Vamos!

Nunca diga que a vida não tem mais a oferecer...



... a gente sempre se surpreende.
E o mais louco: tudo isso aqui é supostamente sério.
Let´s all Praise the Lord!





terça-feira, 4 de março de 2008

Jon Arbuckle por Jon Arbuckle



Garfield minus Garfield é um site que, como o próprio nome já diz, exibe as tiras do gato gordo sem a presença do mesmo, deixando o palco para Jon Arbuckle deixar de ser um solitário crônico tiranizado por um gato e passar a ser um solitário esquizofrênico e totalmente apalermado pelo desejo inatingível de fazer parte da modern society.
E não é que a coisa ficou muito legal?
Recomendação dada pelo Daniel e pelo André, dois caras que adoram um churrasco na laje.

Chupetas

Os anos vão passando e as chupetas vão aumentando de tamanho e de preço, mas não deixam de ser exatamente isso: chupetas, consolos maternais, tranqüilidade ilusória e eficaz que repousa em objetos ou atitudes aparentemente banais e oferece um amortecimento dos medos e um remédio para a solidão. Começa-se com o bico plástico propriamente dito até o dia em que ele vira, digamos, o gargalo de uma garrafa, não importa que seja de uma bebida vistosa e conferidora de status comprada no free shop ou de uma cerveja de menos de um real a long neck.

Talvez possa-se dizer o mesmo dos outros vícios, mas esses eu não conheço tão intimamente, assim que digo que o alcoolismo funciona primordialmente como uma chupeta, um consolo, uma substituição do bico do peito maternal e que nos acompanha até o dia em que nos matamos com esse suposto anestésico ou em que nos entregamos à nossa própria insignificância e encontramos um termo de vida que nos parece mais agradável que o entorpecimento contumaz dos sentidos.

Veja: o álcool como refúgio nada mais é que uma tentativa de afogar demônios internos que há muito aprenderam a nadar em nossos mares de sangue e tripas, e que por isso sempre sobreviverão às nossas enchentes anestésicas. Glamourizamos essas inundações porque gostamos de nos sentir no controle do nosso processo de envenenamento, porém essa ilusão é vazia, arrogante e em muitos casos covarde. Não que isso seja tão digno de reprovação: quem, afinal, é capaz de olhar dentro do seu espelho interno e achar bela a imagem refletida? Existe, claro, a beleza que adorna as garrafas que nos seduzem, e não sou eu quem se atreverá a contestar o prazer trazido por um bom vinho. Mas conheço minha vontade de me afundar no que sai das garrafas, a mamar direto das tetas viníferas e não largar mais o leite entorpecente das uvas. Reconheço-a em mim e em tantos outros que passaram pela minha vida e pelos meus copos.

Que eu me mate aos poucos, então, é glamouroso, romântico e tolo. Porque o romantismo de vir a enfiar todos os meus sentidos nos odores agridoces da interminável disponibilidade de bebidas me parece tão tolo e vazio quanto os romances hollywoodianos de fim-de-semana presenciados por centenas de casais que insistem em alguma forma de forjá-los dentro de seus próprios relacionamentos. Que eu pareça atormentado e incompreendido, pode ser uma imagem convincente. Mas não muda o fato de que sou um bêbado, um alcoólatra (lembremos que o sufixo latra indica quem adora, quem venera), alguém que prefere se ocultar sob a pecha de infeliz a tomar a infelicidade nos punhos e contorná-la às pancadas, com a mesma coragem que me toma quando estou embriagado.

Que eu seja, portanto, um dependente, isso está claro e definido. Que eu morra por essa dependência ou a ela me conforme, aí já não está claro, tampouco definido. Cabe a mim a definição.

Hoje o carro fica na garagem. Não vou sair para comprar mais uma.

Quisiera estar lejos

Sabe aquele vizinho meio freak, algo suspeito, que você não leva a sério e depois descobre que ele era pedófilo? Pois é. Esse é Hugo Chávez, presidente da Venezuela.

Para a maioria dos brasileiros, a Venezuela sempre significou futebol inexpressivo, candidatas a miss Universo e petróleo – por “maioria”, entenda-se os brasileiros que sabem que existe uma país chamado Venezuela que fica na América do Sul. Depois, os órfãos de Guevara (aqueles que insistem em ler a Caros Amigos e que não conhecem o senhor Ernesto além da lenda básica) adotaram o cara como um anti-Bush e caíram no papo de “revolução bolivariana” perpetrada pelo camarada. Fechar TVs, achincalhar vizinhos, nada isso bastou para mudar a opinião do pessoal. Agora, louquinho para puxar briga com a Colômbia e com apoio de outro demagogo (o medíocre Rafael Correa, que vem afundando a já combalida economia equatoriana), esse cara pode acender um barril de pólvora de graça por aqui.

Acho a política – nacional e internacional – uma grande farsa, um jogo mais forjado que o Big Brother, com a fundamental diferença que nesses casos o “paredão” é mais real, sendo que os votantes é que são encaminhados para a berlinda. E nem são necessários tiros: um desvio de recursos da saúde, da educação e do saneamento básico já gasta para garantir umas mortes. Enfim, uma grande manipulação de títeres na qual o público desconhece estar vendo uma encenação e acredita demais nos bonecos, e você só descobre o legedermain quando bateram sua carteira, e depois ainda lhe enviam recibo.

Porém, dessa vez, a farsa promete explodir aqui por perto, como o vizinho que ninguém tinha certeza se era pedófilo ou não. As FARC não são causa da infecção colombiana, são apenas a ferida mais visível. E mesmo assim – com reféns, seqüestros, atentados a bomba, morte de inocentes – uma ferida que desperta admiração de uma intelligentsia meio anacrônica e fascistóide, que se parece muito aos intelectuais tchecos que defendiam a “igualdade comunista” e que depois se capitularam ao conforto capitalista para não serem exilados nem perder seus privilégios. Ideologia de cu é rola, deviam pensar eles. Isso certamente soa menos feio em tcheco.

Já se escreveu que a história só se repete como farsa, e tá aí a “lógica” dos fatos recentes para comprovar isso. O tal mito do “eterno retorno”: tudo se repete, nada tem importância, todos morrem no final. Na literatura e na filosofia, tudo muito lógico. Mas dessa vez não é tese, é fato. Sempre é fato. E tem amigos meus no meio desse fato, pessoas que eu amo e com quem me importo.

Acho que dá para entender porque eu tenho medo.

Piá orelhudo, encheram de porrada na escola... Dá nisso!

segunda-feira, 3 de março de 2008

Constrangimento de bolso

Ao contrário do que muitas pessoas próximas pensam, não sou ator. De vez em quando gosto de subir em um palco e ver o que acontece, se o texto for divertido ou se eu ver que vou aprender algo na montagem. Enfim, algo diletante, no qual me reservo o direito de fazer o que quero e quando quero e posso.

Mas às vezes, muito raramente, me aparecem uns comerciais, e eu os faço também. Via de regra, são filmes promocionais constrangedores para passar no intervalo do Naipi Aqui Agora de Foz do Iguaçu e região. Já fui até garto-propagando do Banco Panamericano, com direito à camisa de manga longa, gravata e cabelo alisado. Mas nenhum superou esse vídeo institucional que fiz no fim do ano passado, e que agora está no ar. Constrangedor até a medula, com a canastrice ligada no máximo e maquiagem grotesca (reparem nos rostos "brilhantes" e na iluminação estourada). Mas paga bem, é grana fácil e ainda sempre tem uns comes e bebes dignos de nota.

Então, deixem-me compartilhar a queimação de filme com os que não moram na Tríplice Fronteira. Acessem http://www.valesulcard.com.br/v3/ e cliquem no vídeo institucional. Para quem nunca viu minha cara, eu sou o mais canastrão (o que faz o papel de otário-alegre). O protagonista é meu amigo e grande ator Theo Mello, que também tá nessa pela diversão.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O coati demoníaco

O coati de madeira que dominou o topo da minha caixa de som me parece demoníaco pela primeira vez desde que ele assumiu seu posto. Poderia dizer que é o peso dos meus crimes na consciência, mas se cometi crimes, desconheço, pois já não tenho mais consciência (uns fiapos aqui e ali, nada mais).
Provavelmente foram os ruídos que se escutam à noite – não os ruídos noturnos, as pessoas que dizem ouvir ruídos noturnos estão dolorosamente equivocadas, lexicamente equivocadas. A noite não range nem geme, a noite está aí e se ela se sobrepõe ao dia com algum estalido não somos nós que conseguimos ouvir. Os ruídos que me despertaram e assustaram são ratos, gambás e outros animais (coatis?) que vivem no forro do teto da casa que adotei como minha, mas minha não é, nem da minha namorada. Pertence a uma Fundação que mantém um Hospital que é sustentado por uma Usina Hidrelétrica. Nada é de ninguém. Tudo é do governo.
Os animais. Seus passos me despertaram do torpor divertido em que estava, lendo o Café-da-Manhã dos Campeões em uma noite quente e comum. Eu ria, um olhar demoníaco de madeira veio aos meus olhos quando os ruídos se fizeram demasiado audíveis para que pudessem ser ignorados e aí, ó dor! ó sofrimento!
Não, que dor e sofrimento que nada, eu não sei o que é dor faz tempo, me mantenho dolorosamente alheio a ele, e é por esse paradoxo que sofro, pois desconheço o sofrimento de sentir uma dor que me lembre de como é estar vivo (piloto automático acionado), e não consegui me libertar do ciclo da dor e ser feliz assim, só me anulei, me nulifiquei como só o podem aqueles dotados de grande capacidade mental. E uns outros tantos medianos, e até outros abaixo da média, mas enfim, quem mais sacrifica sua capacidade intelectual (por capacidade intelectual aqui, entenda-se: velocidade para ler livros, habilidade para redigir duas frases coerentes e facilidade para memorizar coisas nem sempre úteis e falar idiomas que não aquele que me ensinaram desde criança).
Eu estou aqui, já não mais sob o olhar auspicioso de um animal esculpido que me contemplou em dias mais intensos, tomados de erro e felicidade, hoje apenas fragmentos imbuídos de nostalgia que existem espalhados aos cacos em minha memória. Talvez seja incorreto dizer que eu era mais feliz. Eu era mais inconseqüente, sem dúvida. E mais sozinho, ainda que não necessariamente solitário. Minha companhia costuma fazer bem a mim mesmo.
E veja, que são tantos os dias, os bons e os ruins, que eles se misturam e mal nos damos contas deles, porque os dias não são, nós é que fazemos deles o que quer que sejam. Eu imagino que não haja um plano de existência paralelo a esse onde desperte um ser levemente antropomórfico pensando, “caramba, olha só, eu sou 26 de julho, sou um dia legal, acho que vou fazer bem às pessoas hoje”. No dia 26 de julho a avó de alguém vai morrer, alguém vai dar uma trepada memorável, carros vão colidir, deus vai se revelar a uns e se provar inexistente ou indiferente a outros, tudo conseqüência do que cada um fez e faz.
Mas os dias, em geral, são medianos, porque medianos são os homens que os compõem. Às vezes, mesmo os medianos têm um pico de emoção, mas este logo some e não precisa mais estar ali, porque já o soterramos sob as coisas do cotidiano. Assim é? Não, assim fazemos. É assim.
Caminhos tortuosos guiam a minha mente, mas não podem esconder que o que eu queria mesmo agora era saber que amanhã tudo estará resolvido e eu poderei seguir sendo comum. As pessoas costumam gostar de ser comuns, e a maioria que pensa apresentar diferenciação (como se roupas, vocabulário e consumo de substâncias sejam algo que possam nos diferenciar em essência), o faz para atrair a atenção dos comuns. Claro, há os que querem ser ignorados. Esses geralmente têm sucesso no que querem.
Eu acredito em Deus, nos coatis e no que algumas pessoas me dizem. Não é em tudo que essas pessoas dizem que eu deveria acreditar, e no meu filtro passam mais opiniões lisonjeiras que nocivas. Mas enfim, quem sou eu para questionar?

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Os doze discos da década... antes que ela termine!

A explicação do caráter pessoal das listas me parece desnecessária para introduzir essa aqui, mas acho que convém dizer que não baseei essa escolha em critérios “racionais” (“importância” ou mesmo “qualidade” do disco) porque música não é nada racional – pelo menos para quem a ouve (quem a faz pode até mesmo ser terrivelmente racional). Escolhi os álbuns aqui listados pelo prazer que eles me proporcionam, pelo afeto que sinto de suas canções; pela alegria, paz ou desafios que sua audição me proporciona. Assim, até mesmo grandes bandas como Twilight Singers, Nick Cave and The Bad Seeds ou Dirty Three, e mesmo favoritos meus como Everclear e U2, não estão aqui relacionados – estão entre os meus favoritos, mas não entre os mais queridos.
Piegas? Não me interessa. É uma listagem que compartilho aqui. Em parte, espero que ela mude até o fim da década, pois isso significa mais & melhores discos emoldurando mais & melhores dias. Olha que até tem uns pretendentes se insinuando por aqui... Mas fiquemos com a seleção atual:

1) Good News For People Who Love Bad News, Modest Mouse. “Esse disco? O que esses “ratos” têm que mereça esse posto?” Se você já ouviu esse disco sustenta essas perguntas baseadas no pressuposto de que superestimo o disco, reconheço que você possa estar parcialmente certo, mas isso não altera em nada minha opinião tampouco meu afeto para esse compilado de canções que – escrevo isso sinceramente – me devolveu a alegria de viver, e também a de descobrir novos sons. Sabe como é, um dia a gente precisa sair do abismo, e Good News... foi a trilha sonora da minha escalada.

2) Nixon, Lambchop. “The guy in the cross / is holier than I / but then again, he’s made of plastic”. Um disco cuja canção de abertura (“The Old Gum Shoe”) traz esses versos já mereceria atenção especial, mas em suas dez faixas que funcionam como uma egotrip do compositor Kurt Wagner (nenhuma relação com seu homônimo, o Noturno, dos X-Men), Nixon equilibra soul com sotaque country num disco às vezes sensual, às vezes introspectivo – e por outras ocasiões ainda, contemplativo e plácido. E bonito pra caralho. Sublinhou um dos romances mais intensos da minha vida e marcou o início de uma bela amizade com o trompetista Johnathan Marx.

3) Anoche, Babasónicos. De todo o meu mergulho (ainda algo cauteloso) no rock em espanhol, mais notadamente o argentino, a melhor visão obtida foi esse conciso álbum de pop luxuoso e algo perverso, cheio de detalhes musicais, baixos cortantes (saudações à Gabo Manelli, que já não está mais entre nós) e a poesia escapista e ocasionalmente grandiloqûente do pernilongo humano Adrián Rodríguez. Talvez o disco que mais escutei na década (até o presente momento, novamente).

4) Shadows Collide with People, John Frusciante. Sabe aquela “ascensão do abismo” que eu comentei há pouco? Consta que John estava passando por um processo desses, se trancou com um amigo no estúdio de sua casa e fez nada menos que sete discos em um ano. O melhor e mais impressionante desses é esse, que a partir de seu título confronta o imponderável com aquilo que é humano, demasiado humano – tudo numa moldura musical psicodélica, original e muitas vezes sentida, como nas cortantes “Regret” e “Omission”. E – o melhor – tudo com uma certa ponta de esperança, fé torta (“sending a dummy to my god”, canta ele) e a voz inigualavelmente bela e trêmula de Frusciante.

5) Yoshimi Battles The Pink Robots, The Flaming Lips. Porque tem “Do You Realize?”, a música com a letra mais linda de todos os tempos (“In My Life” é hors-concours); porque eu me lembro de ver o sol surgindo em meio ao mormaço nublado na Serra da Mantiqueira enquanto “Fight Test” sae entranhava na minha alma e lutava para mandar dores e desânimo embora; porque tem “Are You a Hypnotist?”, que faz tudo que os Birds queriam fazer com “Eight Miles High”, meio que uma “Tomorrow Never Knows” para esses anos, só que melhor. Porque depois desse disco, nem Wayne Coyne tem mais do que se queixar.

6) By The Way, Red Hot Chili Peppers. Eu não tenho a obrigação de ser desconcertantemente original. Na verdade, posso ser bastante óbvio. E antes que os Chili Peppers começassem a fazer a mesma música o tempo todo, By The Way trouxe “Dosed”, “Universally Speaking” e outras belezas, num disco praieiro, levemente melancólico e perfeitamente executado, com mais sensibilidade que arroubos instrumentais. E o clipe de “The Zephyr Song” é lindo, um exemplo de como a mulher certa (e um diretor inteligente) podem dar sentido e beleza à uma letra tola.

7) The Mix-Up, Beastie Boys. Sou meio ruim para comentar discos instrumentais, acabo caindo numa imprecisão terrível, cheia de adjetivos que não dão conta de expressar o que realmente as composições me transmitiram. Então, deixemos assim: eu levaria esse para uma ilha deserta. Fácil.

8) Know Your Enemy, Manic Street Preachers. Mal o escuto hoje em dia, mas não dá para negar que esse pegou pesado por sua descrença no que chamamos de "sociedade". Apesar do panfletarismo constrangedor de "Baby Elian", o disco tinha uma selvageria demolidora nas letras de "Freedom of Speech Won't Feed My Children" e "Dead Martyrs", além de ser altamente anti-hedonista, agressivo (existe uma disco song mais ácida que "Miss Europa Disco Dancer" e sua coda repetindo "braindead motherfuckers"?) e com um sentimento de entrega desesperada pela vida.

9) Capricornia, Midnight Oil. O Oil sempre foi (e por muito tempo será, provavelmente enquanto eu caminhar na terra) um dos habitantes do meu Top 3, independente de quem sejam os outros dois. É uma das minhas “bandas recorrentes”, aquelas que, mesmo passando longo períodos sem ouvi-la, nunca abandonam meu coração e um respeito. Esse não é meu disco preferido da banda (posto que fica com Breathe, da década anterior), mas é o melhor dos australianos nos últimos anos – e ainda por cima, o canto do cisne para o quinteto. E tem “Tone Poem” e “Under The Overpass”. Não é pouco.

10) Yankee Hotel Foxtrot, Wilco. "I Am Trying to Break Your Heart", canta Jeff Tweedy na abertura. Ele conseguiu. Fecha com "Reservations" ("I got reservations / about so many things / but not about you") e tem no meio "Jesus, etc". Um disco para quando as noites solitárias viram prazer e beleza.

11) Baby, I’m Bored, Evan Dando. Fora It’s A Shame about Ray, nunca fui fã dos Lemonheads, mas o único disco solo digno de nota do seu detonadíssimo líder me surpreendeu. Canções tiradas no violão ou em guitarras limpas, com aquele jeito de quem não quer nada, mas que no fim fazem a trilha de qualquer viagem rodoviária e/ou “intimista”.

12) The Mirror Conspiracy, Thievery Corporation. Por razões que a moral cristã não aprovaria, e por motivos íntimos demais para serem divulgados num blogue, mas resumamos assim: aarrrff!!

Tenho certeza que me esqueci de algum que não poderia ter esquecido. Mas quem está preocupado com exatidão?

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Mais um blog

Porque nessa vida (e há outra?), começar é preciso, tanto quanto terminar.

E como é um ano onde tudo está sendo recriado, é bom estar de volta à velha casa.

Cobertura do Cosquín Rock 2008 no Scream&Yell.

Porque uma viagem muda várias vidas.

Abração, e bem-vindos os que assim quiserem!

Leo Vinhas